Um ano após o trágico acidente com o voo 2283 da Voepass, novas revelações colocam ainda mais dúvidas sobre a conduta da companhia aérea e os bastidores daquela manhã fatal. O turbo-hélice ATR 72-500, que decolou de Cascavel (PR) com destino a Guarulhos (SP) no dia 9 de agosto de 2024, caiu na cidade de Vinhedo, matando todas as 62 pessoas a bordo, entre passageiros e tripulantes.
Agora, uma gravação divulgada pelo Fantástico revela que um funcionário da Voepass reconheceu, em conversa gravada, que uma falha importante da aeronave foi omitida antes da decolagem.
Sem saber que estava sendo gravado, o funcionário da manutenção desabafou sobre o remorso que sente por não ter formalizado a falha no sistema de degelo. “Errei, errei de não ter mandado por escrito”, disse.
Outro técnico presente na conversa chegou a orientar: “Printa, manda pro teu celular, guarda isso daí”, sugerindo que o caso poderia gerar consequências graves. A gravação, feita um mês após o acidente, mostra que havia consciência de que algo muito sério havia sido negligenciado.
Sistema de degelo falhou, e comandante não deixou registro oficial
De acordo com apuração da reportagem, o problema no sistema de degelo foi percebido ainda durante o voo anterior, quando o comandante pousou em Ribeirão Preto e solicitou verbalmente uma revisão. No entanto, sem registro oficial no diário de bordo, a manutenção não foi feita e o avião acabou sendo liberado para o voo seguinte. Segundo um mecânico que preferiu não se identificar, o ambiente na companhia era de pressão constante, o que desestimulava a anotação de panes para não comprometer a operação.
Naquele dia, um boletim meteorológico alertava para formação intensa de gelo em várias altitudes, o que exigia atenção redobrada dos pilotos. No entanto, apesar de o sistema de degelo ter sido acionado três vezes durante o voo, a aeronave não desceu de altitude, como indicam os manuais, e acabou perdendo sustentação ao fazer uma curva de aproximação para o pouso. A tragédia parecia iminente diante da sequência de decisões e omissões que antecederam o acidente.
Famílias ainda buscam justiça e lamentam falhas que poderiam ser evitadas
Entre as vítimas estavam pessoas com diferentes histórias e destinos. O casal Nélvio e Gracinda, pais da jovem Eduarda Hubner, embarcou com planos de assistir a um show em São Paulo.
Antes da decolagem, enviaram uma última mensagem: “Estamos embarcando agora, se cuidem, está vento frio”. Também estavam no voo o agrônomo Hiáles e sua esposa, Daniela, atleta de fisiculturismo com competições agendadas nos Estados Unidos.
A dor das famílias segue viva e agora ganha um novo capítulo com a revelação da gravação. A Polícia Civil, que concluiu o inquérito afirmando que não houve negligência, poderá ser pressionada a rever o caso diante das novas provas. A Voepass, por sua vez, declarou que adotará novos protocolos internos, mas não comentou a gravação vazada.
Para os parentes das vítimas, nada irá apagar a dor, mas a busca por justiça continua. O silêncio de um registro, a omissão de uma falha e a pressão sobre profissionais que poderiam ter impedido a tragédia ainda ecoam como gritos de alerta dentro da aviação nacional.